Brasil: Investigação revela que Cargill, Bunge e COFCO compram soja ilegal de fornecedores multados por desmatamento e incêndio na Amazônia
“ ‘Soja-pirata’ cultivada na Amazônia acelera desmatamento e tem participação de gigantes do agro”, 19 de Maio de 2021
Se, por um lado, regras rígidas blindam a Amazônia contra o avanço da soja, por outro, imagens de satélite e documentos mostram uma realidade diferente: uma floresta que segue sendo destruída pela demanda global do grão – e com a participação de gigantes do agronegócio. É o que revela uma investigação conjunta da Repórter Brasil, do Bureau of Investigative Journalism e do Unearthed, que descobriu que três multinacionais compraram soja de revendedoras que foram abastecidas por uma produtora rural multada em R$ 12 milhões por desmatar e incendiar a floresta amazônica. Trata-se da sojeira Alexandra Aparecida Perinoto, de Marcelândia, no norte do Mato Grosso, que vendeu para a chinesa Fiagril e para a russa Aliança Agrícola do Cerrado – duas intermediárias que, por sua vez, forneceram para as gigantes Cargill, Bunge e Cofco.
Usando imagens de satélite, registros de fiscalização e outras evidências, a investigação descobriu como a soja foi plantada ilegalmente por Perinoto em terras embargadas pelo Ibama por terem sido desmatadas... pode entrar em cadeias de abastecimento internacionais supostamente “limpas”, apesar da existência da Moratória da Soja, mecanismo criado em 2006 para deter a destruição da floresta amazônica. Assinada por todas as principais empresas do agronegócio, incluindo Fiagril, Aliança e os três gigantes internacionais (Cargill, Bunge e Cofco), a moratória proíbe a compra ou exportação do grão cultivado em áreas na Amazônia que foram desmatadas depois de julho de 2008...
Contudo...investigação revela brechas no sistema de monitoramento da moratória, que permite que as empresas continuem comprando soja de agricultores ligados ao desmatamento ilegal...Não foi a primeira vez...
Perinoto também foi alvo de outro embargo, desta vez do órgão ambiental estadual (Secretaria de Meio Ambiente do Mato Grosso), aplicado em 2016. Somadas, as multas da sojeira totalizam R$ 12 milhões. Além disso, ela também é alvo de uma ação movida pelo Ministério Público por conta das infrações ambientais.
… Procurada por email e por telefone, Alexandra Perinoto se recusou a responder as perguntas. “Não tenho nada a declarar. O que você publicar vai ter que provar”, disse a fazendeira por telefone.
A Aliança não negou ter comprado o grão de Perinoto e afirmou que passa, regularmente, por auditoria independente.... A empresa disse ainda que lida com “incontáveis agricultores e produtores no Brasil” e que “negócios fora do controle da Aliança permanecem sob a responsabilidade exclusiva de um determinado agricultor/produtor”.
A Fiagril disse que “não adquiriu soja de áreas proibidas devido a danos ambientais”, mas não negou ter comprado da desmatadora. E acrescentou que “em fevereiro de 2021, após auditoria da safra 2019/20, a Fiagril recebeu declaração oficial assinada pela Associação Brasileira das Indústrias de Óleo Vegetal (Abiove) e Greenpeace atestando o cumprimento integral da moratória da soja”.
O Greenpeace disse, no entanto, que a afirmação da Fiagril é imprecisa, já que a auditoria da safra 2019/2020 foi “incompleta e inconclusiva” e solicitou mais informações aos comerciantes...O Greenpeace reconheceu que o sistema de monitoramento da moratória “não é perfeito” e que está “pressionando por melhorias, incluindo maior transparência e escrutínio adequado de fornecedores indiretos e estratégias para evitar a triangulação da soja”...
Registros obtidos pelo Bureau mostram que a Bunge comprou soja da Fiagril, enquanto a Cargill e Cofco adquiriram da Aliança...
…A Bunge informou que não compra soja da Aliança desde 2017 e que a Fiagril não fornecia soja de Marcelândia.
...Cargill disse que não comprou soja “diretamente” de Perinoto, mas mesmo assim afirmou que irá investigar Fiagril e Aliança do Cerrado.
... Cofco afirmou que realiza auditorias internas mensais, “bem como auditorias externas anuais sobre o cumprimento da Moratória por parte dos fornecedores. A auditoria de 2019 confirmou que todos os nossos fornecedores cumpriram os requisitos da Moratória na temporada passada.